Qual o seu veredicto?
- Victor Câmara
- 4 de ago. de 2017
- 4 min de leitura

Segue breve relatório do caso:
“Na cidade de Morsang-sur-Orge, Aix em Provence, próximo a Paris, o cidadão Manuel Wackenheim com pouco mais de 1,14m, participava de eventos organizados em discotecas. Tais eventos eram organizados pela Companhia Société Fun-Production onde os participantes procuravam atirar um anão, protegido com um capacete e roupas com alça, à maior distância possível. E mais, o cliente que lançasse mais longe ganhava o prêmio da noite.
Tal modalidade rapidamente ganhou notoriedade, em jornais locais, ficando conhecido como ‘lancer de nain’, o que acabou chamando atenção das autoridades públicas francesas. Com isso, o Ministro do Interior Francês estabeleceu um política para eventos, proibindo esses espetáculos públicos. Esse banimento baseou-se na proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais (que proíbe a tortura e punição ou tratamento degradantes); na proteção da ordem pública, bem como a moral pública.”
Eis o relatório, passa-se para a defesa a favor da proibição:
Primeiramente, o princípio da dignidade humana está na barca de conceitos universais, pensado para proteger todo e qualquer ser humano, porque visa garantir condições mínimas de existência. Este conceito ultrapassa barreiras e limites até mesmo estabelecidos por outros Estados.
Tal princípio faz-se necessário na diferenciação entre seres vivos e máquinas ou objetos inanimados. Immanuel Kant assim define: “No reino dos fins, tudo tem, das duas uma: um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade”. Ou seja, a dignidade humana não pode ser comprada ou monetizada, tanto que falamos em trabalho digno e indigno. Caso assim não o fosse, a escravidão considerar-se-ia legitima, algo absurdo para o grau de evolução da nosso sociedade.
O fato do Sr. Manuel Wackenheim apontar que esse “trabalho” lhe gerava fundos e meios, não afasta à indignidade. A própria Constituição garante que mesmo no trabalho, serão empregados valores sociais que, por sua vez, são constituídos de tudo aquilo que consideramos justos, corretos e aceitáveis (artigos, 1º, 6º da Constituição Federal - Link para CF => http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm).
Nesse mesmo sentido, o Código Civil aponta, em seu artigo 11º, que os direitos da personalidade não podem sofrer limitação voluntária. Não posso abrir mão da minha vida para outro ou abdicar da minha condição de humano em troca de dinheiro.
Fora isso, os valores sociais estão relacionados com a ordem pública e devem estar atreladas ao papel do Estado em minimizar tais injustiças que por ventura ocorrer. Ordem pública implica em cuidar e administrar os valores sociais em que o indivíduo está inserido, para melhor convivência entre seus pares.

Devemos prezar pela garantia de mais direitos humanos contra abusos de terceiros, não ir na via oposta como pretende o Sr. Manuel Wackenheim.
Todo o poder do Estado emana do povo, para garantir que os princípios norteadores da sociedade sejam respeitados, até mesmo proteger, em certos casos, o indivíduo de sua própria vontade.
Isto implica, também, no poder de polícia estatal (proibições, entre elas) para fazer valer todos os direitos e deveres. Caso contrário, todas as instituições mantenedoras da paz se esfacelaram e, consequentemente, estaremos entregues ao caos.
Por fim, ilustríssimo (a) julgador (a), deixo alguns questionamentos: A escassez de trabalho legitima a submissão à objeto de lazer alheio? O fato de uma atividade ilícita ser praticada por indivíduo, sem outro meio de subsistência, é motivo suficiente para permiti-lo? São sobre estas morais que devemos erguer o futuro?
Passa-se a defesa contra a proibição:
Começo evocando o artigo 170º da Constituição “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; (...)”.
Posto isso, pergunto: Qual a diferença entre o palhaço circense e o anão? Organização, consentimento? Todos ganham o sustento provocando riso dos outros, através da brincadeira consigo. A justiça social falhou para com o Sr. Manuel Wackenheim, pois proibiu o meio de garantir sua própria subsistência antes e agora com essa proibição.
Segundo Veneziano (2011) “O contrato de trabalho, como qualquer negócio jurídico, requer, para sua validade, agente capaz e objeto ilícito (art. 104 do código civil)”. Analisando o caso, a supressão de sua dignidade foi momentânea e consciente, visto que desempenhava os horários como qualquer outro trabalho e recebia por isso (até mesmo proteção). Não se trata de abandonar a sua humanidade ou dignidade, ao contrário, foi a ferramenta que encontrou de conseguir sua independência financeira e auto afirmar na sociedade.
O Sr. Manuel Wackenheim não pede para ser amparado pela sociedade, somente que o deixe trabalhar, como se não bastasse todas as dificuldades por ser anão.
Deste modo, com a revogação da proibição, o trabalho dele está acobertado pelo artigo 7º da Constituição Federal que dispõe de todos os direitos do trabalhador rural e urbano. E mais, não existe nenhuma ilicitude nesse emprego, visto que é irrevogável a busca pelo pleno emprego, ou seja, ninguém deve impor qual trabalho alguém deve perseguir.
Por fim, ilustríssimos (as) julgadores (as), sabemos que a “moralidade” por muita das vezes se modifica ao longo do tempo. Partindo disso, deveríamos cortar os meios de subsistência de alguém por algo tão maleável como a moral? Condenar o Sr. Manuel Wackenheim a retornar para a invisibilidade e desprezo?

Bom, tentei sintetizar todos possíveis argumentos nesse breve texto, agora é com você. E ai, qual o seu veredicto?
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